segunda-feira, 7 de novembro de 2011

O testamento vital grego


«Há muito poucas repúblicas no mundo, e mesmo assim elas devem a liberdade aos seus rochedos ou ao mar que as defende. Os homens só raramente são os dignos de se governar a si mesmos.» ― Voltaire


A crise grega transbordou fronteiras e transformou-se rapidamente no drama da sobrevivência do sonho europeu, representado, contemporaneamente, por pouco mais que uma união política, económica e monetária a duas velocidades.
Por estes dias, a “zona euro” ficou à beira do caos após o anúncio do primeiro-ministro grego, George Papandreou, de referendar o novo pacote de ajuda a económica ao País acordada com a União Europeia e o FMI, ou seja, no fundo – como logo emendaram alguns líderes europeus –, confirmar a permanência da Grécia na moeda única europeia.
Entre avanços e recuos, crises políticas e pedidos de formação de um Governo de “salvação nacional”, Papandreou, acossado pela ameaça da suspensão da ajuda económica acordada, “deu o dito pelo não dito”, resolvendo internamente a crise criada pela indigitação de um novo primeiro-ministro.
Mas, a questão que põe é: será, ou não, legítimo à Grécia escrever uma espécie de “testamento vital”?, isto é, decidir do seu destino, escolher a que medidas de ajustamento económico se quer sujeitar.
Se é certo que a imposição pelos credores de condições para a concessão do empréstimo com vista a, no futuro, serem reembolsados é perfeitamente razoável e decorre da mais elementar sensatez, parece que também é lícito à Grécia aceitar, ou não, tais condições, arcando, já se vê, com as consequências do imaginável colapso financeiro no caso de optar pela recusa, que mais não seria que uma inevitável saída do euro.
Sabe-se que as últimas medidas de ajustamento impostas pelos credores ao Governo grego conduzirão, previsivelmente, a uma severa recessão económica de, pelo menos, um par de anos e um nível de desemprego de atingirá cerca de um quinto da população activa. Parece pois pertinente conceder ao povo grego o direito, inalienável, de se pronunciar sobre a aceitação dessas injunções.
Aqui chegados, levanta-se uma outra questão: os Tratados prevêem a possibilidade dos Estados-membros abandonarem a moeda única? E em que circunstâncias? A verdade é que não! Em termos legais a construção da zona euro não prevê a possibilidade de “desistência” apenas da moeda única: o Tratado de Lisboa admite, no seu artigo 50º, a possibilidade de um País decidir a sua saída da União Europeia, mediante uma negociação, mas não da moeda única. Ou seja, abandonar o euro parece – além muito caro e praticamente inviável para um país como a Grécia –, juridicamente bastante difícil, pois actualmente só será possível saindo simultaneamente da União Europeia.
Nesta linha, Mario Draghi, o novo presidente do BCE, confirmou recentemente que o abandono da moeda única por um Estado «não está previsto no Tratado» e que, por isso, não é possível de ser equacionada, salientando, no entanto, que a situação grega é «excepcional e única».
Chegados a esta conclusão, cuido que o título desta crónica deveria ser “A quadratura do círculo”.

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