domingo, 25 de dezembro de 2011

Da globalização ao euro: o fim do “sonho europeu”?



«fazer a Europa é fazer a paz» ― Jean Monnet

A queda do Muro de Berlim, em 1989, o final da Guerra Fria e o desmantelamento da União Soviética, por um lado, e o abandono da economia colectivista por parte da China e sua adesão ao sistema capitalista, por outro, promoveram a líder mundial a única superpotência que restou, os Estados Unidos da América (EUA), e iniciaram uma nova era da globalização, sob a égide do capitalismo anglo-saxão. Para trás, ficou a velha ordem dominada pela oposição entre duas superpotências separadas tanto pelas questões ideológicas, como pelo jogo dos equilíbrios estratégicos.
A conjuntura político-estratégica alterou-se profundamente.
Um cenário inédito na história da Humanidade: os capitais e investimentos passaram a circular de um lugar para o outro, sem quaisquer obstáculos fronteiriços, e a indústria da informática assumiu a vanguarda das inovações, construindo as auto-estradas de informação (p. ex., a Internet) necessárias a tais movimentos.
Com o fim da Guerra Fria e com a globalização, os Estados trataram de compor-se segundo sua proximidade geográfica: na Europa a União Europeia acelerou o processo de integração e unificação, criando mesmo uma moeda única – o euro –, chegando em 2007 aos, actuais, 27 Estados-membros, e tendo já acordado com a Croácia a respectiva adesão em 2013.
Mais de duas décadas passadas, como vivemos a globalização?
O ano de 2011, que agora finda, trouxe-nos – além de catástrofes naturais (p. ex., no Japão, um sismo seguido por um tsunami deixou o País perto duma catástrofe nuclear) e das revoltas políticas no Norte de África e o Médio Oriente – o acentuar da crise financeira na Europa, que mais não é que o resultado da crise bancária iniciada em 2008 com a queda do banco de investimento norte-americano Lehman Brothers.
Não há milagres para resolver a crise financeira que assola a Europa: a par dos políticos, um sem número de teóricos apresentam diariamente uma panóplia de receitas para a situação. Certo apenas será que há direitos a mais para a riqueza criada.
Ao euro apenas poderá valer o próprio euro: em dez anos a moeda europeia tornou-se a segunda moeda mundial e gerou a maior economia global. A zona euro engloba 17 países, com mais de 330 milhões de habitantes, é o segundo maior bloco comercial do mundo.
Todos dizem que o fim da zona euro e, concomitantemente, da própria União, teria, além perda do estatuto de potência mundial da Europa, custos incomensuráveis, nomeadamente com a falência do sistema bancário europeu. Nesse cenário, assistiríamos certamente a uma deslocação do poder mundial para a Ásia, liderada pela China.
Os próximos anos dirão se vivemos o princípio do fim ou apenas o início de uma refundação do “sonho europeu”, com ênfase na qualidade de vida, sustentabilidade e paz, apenas possível numa Europa coesa, unida e solidária.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Deveras


«Vangloriem-se as gentes do que quiserem, coragem ou erudição, inteligência ou espírito, êxito junto das mulheres, riqueza ou nobreza; quanto a nós, concluiremos que é justamente nesse capítulo que lhes falta qualquer coisa; aquele que possui realmente e em absoluto uma qualidade nem sequer pensa em alardeá-la ou presumi-la; está completamente tranquilo no que toca a esse assunto.»

A. Schopenhauer, in «Aforismos»



O que é a verdade? É uma questão que tem evidente ressonância bíblica e à qual os evangelhos não dão uma resposta pronta e literal. Pelo contrário, quando Pilatos interroga Jesus nesse sentido - «Quid est Veritas?» -, Jesus responde-lhe com o mais absoluto silêncio, um silêncio enorme, imenso, completo, que vem atravessando os séculos.

Naturalmente que não é das grandes questões metafísicas que se vai pretender tratar aqui. Antes das pequenas verdades quotidianas, feitas e esculpidas pelo Homem, e à escala humana, as quais se revelam, normalmente, meras verosimilhanças ou, por vezes, a mais trivial das mentiras.

Pois tal como se educa uma criança dizendo-lhe que não deve meter o dedo no nariz, também se lhe ensina que não deve mentir. Diz-se, calmamente, que, tanto uma coisa como a outra, são coisas feias de se ver e piores de se fazer. Então a criança compreende que, por limpar o nariz com o dedo, terá de limpar o dedo de seguida, talvez nos calções, que, depois, terão de ser limpos também. Enfim, todo um processo fastidioso, um pouco sujo (para não dizerranhoso”), evitável pelo bom uso de lenços de papel. Ora, analogamente, sucede com o acto de mentir. Basta dar a perceber à criança que a verdade, embora à primeira vista possa não o parecer, é sempre mais simples, bonita e, até, vantajosa do que a mentira. De facto, uma vez chegada à idade adulta, constatará pela conduta de certas pessoas que, quando foram pequenas, do tamanho dela, lhes ensinaram injustamente o oposto: que bom e vantajoso era mentir. O que, a seu tempo, acarretará, para essas mesmas pessoas, consequências normalmente penosas e muito pouco vantajosas: com efeito «nunca ninguém enganou toda a gente o tempo todo».

Em suma, aprender a assoar o nariz e a assoar a mentira, logo de pequenino, contribui bastante (a par dos outros grandes desafios da vida) para a edificação de uma sociedade mais próspera, decente e evoluída.

(Publicado no jornal «O Primeiro de Janeiro», em 22 de Dezembro de 2011)

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Destino, acaso ou coincidência?

«É impossível levar o pobre à prosperidade através de legislações que punem os ricos pela prosperidade. Por cada pessoa que recebe sem trabalhar, outra pessoa deve trabalhar sem receber. O governo não pode dar a alguém aquilo que não tira de outro alguém. Quando metade da população entende a ideia de que não precisa trabalhar, pois a outra metade da população irá sustentá-la, e quando esta outra metade entende que não vale mais a pena trabalhar para sustentar a primeira metade, então chegamos ao começo do fim de uma nação. É impossível multiplicar riqueza dividindo-a.»

A queda do primeiro-ministro grego, o socialista George Papandreou, e o desastre eleitoral das esquerdas em Portugal e Espanha não são episódios isolados de mudanças políticas a reboque da crise financeira.
Apesar da miríade de problemas que a União Europeia enfrenta e da crescente afirmação do “eixo” franco-alemão, estas transformações foram germinadas já há muito tempo.
Não será surpreendente que, nas actuais condições económicas, as forças políticas de esquerda percam sucessivas eleições a favor das de direita?
Não será tão surpreendente se atentarmos que as políticas dos vários governos socialistas por essa Europa fora dependiam de um único factor: o crédito barato concedido aos Estados e às respectivas economias pelos mercados financeiros internacionais. A actual crise financeira fechou a torneira do crédito barato, o que impediu que o socialismo continuasse a financiar a sua megalomania social, incomportável face ao crescimento da riqueza produzida por cada País.
Se há um limite de tolerância para todos os sacrifícios que vamos ter de suportar nos próximos anos, também haverá um limite para a impunidade de todos quantos nos colocaram nesta situação e hipotecaram o futuro – a curto ou a logo prazo, logo veremos – das gerações que nos seguirão: prometeram-nos o Paraíso e deram-nos o Inferno.
A Europa, e em particular a Península Ibérica, terá de apostar na reabilitação da economia pelo estímulo ao investimento e ao trabalho, não – como até aqui – no patrocínio da “subsídio-dependência” e no incentivo do laxismo e da preguiça. É essencial uma viragem no modo de funcionamento da economia, é essencial acabar com a tendência generalizada dos empresários e empreendedores para culpar o seu falhanço empresarial por falta de apoio do Estado.
O Estado não tem, necessariamente, que apoiar pela forma a que estamos habituados (subsídio e benefício fiscal), tem apenas que não se intrometer em demasia na iniciativa privada, nem embaraçar a actividade empresarial com impostos exorbitantes, exigências formais desmesuradas e burocracias desajustadas. Esse já será o grande apoio do Estado ao investimento.  
A solidariedade não se faz desbaratando dinheiro, arruinando os Países e hipotecando o futuro das gerações vindouras, é necessário incentivar a criação de riqueza e encontrar o ponto de equilíbrio com a promoção do bem comum.
Como escreveu Vasco Pulido Valente, «o Estado Social Europeu é insustentável e está a roubar o futuro às novas gerações. (…) A realidade e a vida é trabalho, sacrifício e vontade de vencer.».