segunda-feira, 16 de abril de 2012


Importa-se de se despedir?


«Quando se está preso, o pior é não poder fechar-se a porta.» Stendhal


A história resume-se em poucas palavras: Albert Florence, um pacato cidadão americano residente em Nova Jersey foi detido, há seis anos, pela polícia após ser acusado de não ter pago uma multa de trânsito. Nos estabelecimentos prisionais onde foi ficou detido por mais de uma semana até ser presente a um Tribunal, Florence foi por um par de vezes sujeito a revistas, nomeadamente obrigado a tirar as roupas, levantar os órgãos genitais e tossir em posição de cócoras, para que os guardas prisionais se certificassem que não escondia qualquer objecto no corpo, conforme normas daqueles estabelecimentos prisionais.
Depois de tal episódio, Albert Florence avançou com um processo judicial (Florence v. Board of Chosen Freeholders of County of Burlington), argumentando que as revistas que foi sujeito violam a Quarta Emenda da Constituição americana, especialmente quando efectuadas rotineiramente a pessoas detidas por delitos menores, já que as revistas policiais como as que foi sujeito são uma medida extrema, que devem ser usadas apenas quando há razões para acreditar que a pessoa específica pode esconder armas, drogas ou outros objectos.
Muitos tribunais federais americanos têm sustentado a argumentação de Florence, defendendo que a Constituição proíbe tais revistas a pessoas presas por delitos menores, a menos que haja suspeita individualizada.
Mas o Supremo Tribunal dos Estados Unidos validou a actuação daqueles estabelecimentos prisionais, sustentando ser permitida a realização de revistas rotineiras em pessoas que são acusadas de crimes menores, mesmo que não exista nenhuma razão específica para acreditar que eles estão a esconder qualquer objecto, argumentando, ainda, que os carcereiros têm sérias dificuldades de operação e as revistas podem ajudar a manter armas e doenças fora das prisões.
A decisão do Supremo Tribunal foi tomada por cinco votos a favor e quatro contra, rejeitando assim a maioria dos Juízes o argumento de que nos casos de pessoas detidas por delitos menores (p. ex., condução com um farol do veículo fundido, multas de estacionamento não pagas, andar de bicicleta sem uma campainha audível), nenhuma delas pessoas poderia ter previsto ser preso e nenhuma, provavelmente, teria escondido armas ou outros objectos dentro de suas cavidades corporais. Ser forçado a despir-se e ficar nu perante estranhos é "humilhante e degradante", argumentam os defensores das razões de Florence, classificando de “assustadora” a decisão do Supremo Tribunal, cuja lógica pode transformar uma democracia num Estado policial ao pretender eliminar todos os riscos em detrimento dos direitos individuais dos cidadãos.
No Mundo actual, face aos novos perigos e às novas ameaças, será legítimo substituir a liberdade, nomeadamente a liberdade individual, por um conceito alargado de segurança, entendido como «redução da incerteza»?

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